Como justificareis a minha morte perante Deus? Pois que me matastes a mim, cujo único mal é o grande amor que vos tenho, que não há amor maior, e por vós morrerei. Essa será a única razão que Lhe podeis dar da minha morte, não O podereis enganar, que Ele bem sabe quanto vos amo e que nunca mereci que de vós me adviesse a morte. Por tal injustiça, nunca d’ Ele obtereis perdão, pelo que sereis condenada, quando todos formos diante d’ Ele.
Que razom cuidades vós, mia senhor,
dar a Deus, quand’ ant’ El fordes, por mi
que matades, que vos nom mereci
outro mal senom que vos hei amor
aquel maior que vo-l’ eu poss’ haver,
ou que salva lhi cuidades fazer
da mia morte, pois por vós morto for?
Ca na mia morte nom há razom
bona que ant’ El possades mostrar,
desi nom o er podedes enganar,
ca El sabe bem quam de coraçom
vos eu am’ e nunca vos errei;
e por em quem tal feito faz bem sei
que em Deus nunca pod’ achar perdom.
Ca de pram Deus nom vos perdoará
a mia morte, ca El sabe mui bem
ca sempre foi meu saber e meu sem
en vos servir. Er sabe mui bem
que nunca vos mereci por que tal
morte por vós houvesse, por em mal
vos será quand’ ant’ El formos alá.